quinta-feira, 5 de maio de 2011

O tártaro nos dentes dos neandertais

Muitas criancas, assim como os extintos homens de Neanderthal, não gostam de escovar os dentes. Enquanto nos desesperamos com o acúmulo de tártaro (cálculo dental) nos dentes de nossos filhos, cientistas se deliciam com a falta de higiene bucal dos neandertais. Analisando os depósitos de tártaro nos dentes fossilizados, eles descartaram uma das possíveis razões para sua extinção.
O homem de Neanderthal (Homo neanderthalensis) foi um parente distante do Homo sapiens que surgiu na Europa e na Ásia aproximadamente 500 mil anos atrás. Eles habitavam esses continentes até 30 mil anos atrás.
Sua extinção coincidiu com a expansão de nossa espécie, que, vindo da África, se espalhou pela Europa e Ásia. As razões da extinção ainda não estão claras. Muitos acreditam que foram mortos por nossos ancestrais. Hoje sabemos que sua relação com nossos ancestrais foi íntima. Os 2% de genes de origem neandertal que sobrevivem em nosso genoma demonstram que, além de brigas, houve cruzamento entre as espécies.
Uma das teorias para a extinção dos neandertais é de que eles somente se alimentavam da carne de grandes animais e tiveram dificuldade de competir com o Homo sapiens, que, mesmo antes de desenvolver a agricultura, já incluía vegetais na sua dieta. Restos de vegetais foram encontrados juntos aos ossos de neandertais, mas como saber se eles faziam parte da dieta? Foi aí que três pesquisadoras tiveram a ideia de examinar o tártaro acumulado nos dentes. É bem conhecido que o tártaro, que se forma pelo acúmulo de sais de cálcio na superfície dos dentes, pode conter restos de comida preservados no seu interior.
Foram analisados sete dentes, três deles coletados na caverna de Shanidar, nas montanhas Zagros, no atual Iraque, e quatro coletados na caverna de Spy, em Jemeppe-sur-Sambre, na atual Bélgica. A caverna no Iraque foi escavada entre 1952 e 1957 e os dentes são de aproximadamente 50 mil anos atrás. Na Bélgica, os esqueletos de neandertais foram descobertos em 1885 e os dentes datam de aproximadamente 34 mil anos atrás. O tártaro foi removido com uma cureta, semelhante à que os dentistas limpam nossos dentes, e o pó resultante, examinado em um microscópio. Entre os cristais inorgânicos foi possível encontrar grãos de amido fossilizados.
Esses grãos são arredondados e sua forma e tamanho, típicos de cada planta. Da mesma maneira que podemos separar grãos de milho, arroz, soja e centeio, é possível identificar a origem das pequenas partículas de amido no microscópio. Essas partículas, que medem por volta de 10 micrômetros, foram separadas por tipo e classificadas, comparando sua forma com grãos de amido coletados de plantas que existem hoje.
No total, foram isoladas 93 partículas de amido do tártaro dos dentes coletados no Iraque e 136 partículas dos dentes belgas. Foram identificados grãos de amido provenientes de coquinhos de palmeiras, de diversos legumes e de gramíneas, indicando que em ambas as regiões os neandertais se alimentavam de diversos vegetais. Mas o mais interessante é que muitos desses grãos de amido apresentavam uma forma típica dos grãos de amido quando eles são cozidos, o que sugere que parte desses vegetais era consumida após ser cozida.
Tudo isso sugere que os neandertais já se alimentavam de vegetais, possuíam uma dieta variada e haviam desenvolvido os rudimentos da culinária. Essa descoberta vai contra a teoria de que eles somente se alimentavam de grandes animais e a diminuição do número desses animais talvez estivesse relacionada à sua extinção.
Fonte: Estadão

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